Na acolhida ao outro, assumimos a responsabilidade por essa pessoa. Esse acolhimento nos coloca em uma posição de igualdade, mesmo que o outro possa parecer estar em uma posição superior. A igualdade acontece porque o outro se revela na nossa responsabilidade, uma vez que a própria condição humana envolve fraternidade. Além disso, toda relação social remonta à apresentação de uma pessoa à outra, sem qualquer intermediação de imagem ou de sinal, unicamente pela expressão do rosto.
Bento XVI, na Encíclica Caritas in Veritatis (78), concordando com o pensamento de Paulo VI, expressa na Populorum Progressio (278), afirma que o ser humano, por si só, não pode alcançar um verdadeiro humanismo ou gerir seu progresso. Só quando reconhece o chamado a integrar a família de Deus, ele se torna apto a promover um humanismo integral, orientado pela caridade e guiado pela verdade divina. A abertura a Deus fomenta a solidariedade e a alegria no serviço aos irmãos, enquanto a ideologia simplista e alienante e o ateísmo afastam o homem de Deus e ameaçam os valores humanos e o verdadeiro desenvolvimento.
Francisco, em Fratelli Tutti (111), enfatiza que a pessoa, com direitos inalienáveis, naturalmente busca criar vínculos e se transcender no encontro com os outros. Ele alerta contra a visão individualista dos direitos humanos, que desconsidera o contexto social, e destaca a solidariedade como virtude essencial, resultado de uma conversão pessoal e de um compromisso coletivo. Francisco sublinha o papel crucial das famílias, educadores e meios de comunicação na promoção de valores como liberdade, respeito e solidariedade, sobretudo no cuidado e proximidade com os mais vulneráveis (FT 114s).
Esses aspectos humanos, morais, sociais e existenciais derivam da nobreza do ser da pessoa humana, exigem um olhar divino, capaz de recriar com compaixão, misericórdia, justiça e esperança – como visto com Adão, Eva e Pedro – a fraternidade a preconizar o sentido da criatura humana. Isto se dá pela conversão ao olhar divino, que nos relembra nossa dignidade. Corrigido nosso autoconceito, somos chamados a olhar nossos irmãos, especialmente os que padecem as consequências da negação e do pecado, seu ou de outrem. Lançando o olhar também aos que sofrem no corpo ou na alma, social ou existencialmente, para ajudá-los e confirmá-los na justiça. Deste modo, Deus restaura a comunhão original, pois diz: “tudo quanto fizestes a um destes pequeninos a mim o fizeste” (Mt 25,40). Por fim, após explorar a visão teológica da condição do homem, é fundamental considerar a centralidade de Jesus como exemplo desse olhar compassivo e acolhedor.
(20ª parte da sequência de reflexões sobre o tema “A Dignidade Humana sob o olhar de Deus“).