O evangelista João recolhe um longo discurso de despedida de Jesus, onde são apresentados, com uma intensidade especial, alguns traços fundamentais que seus seguidores hão de recordar e viver ao longo dos tempos, para serem fiéis a Sua pessoa e a Seu projeto.
Jesus não apresenta aos seus discípulos uma “constituição” com seus capítulos e artigos, nem algumas “regras” e, menos ainda, alguns “estatutos”. Só diz assim: “Este é o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei”. O mandamento que Ele vive, também deseja que seja vivido por seus seguidores e seguidoras. Nada mais. Aprender do Mestre e praticar, como Ele, a arte de amar!
Em qualquer época e situação, o decisivo para o Cristianismo é não se afastar do amor fraterno. Nesse sentido, o mandamento do amor não é lei que se impõe de fora para dentro; ele “emana” do interior de cada um, pois todo ser humano traz em si a marca do Criador, que é puro Amor. Por isso, manifestar plenamente esse amor que é Deus, nas relações com os outros, é a expressão da verdadeira identidade cristã.
Há uma diferença que é preciso aclarar. Deus não é um ser que ama: Ele é o Amor, ou, em melhor tradução, “Deus consiste em estar amando”.
Em Deus, o Amor é sua essência, não uma qualidade como em nós: podemos amar ou deixar de amar. Se Deus deixasse de amar um só instante, deixaria de ser Deus. Ele manifesta seu amor a Jesus como manifesta a cada um de nós. Mas não faz isso como nós. Não podemos esperar de Deus “mostras pontuais de amor” porque Ele não pode deixar de demonstrar isso um só instante.
O Amor de Deus é o primeiro; Ele não nos ama como resposta ao que somos ou fazemos, mas por aquilo que Ele é. Deus ama a todos da mesma maneira, porque não pode amar mais a um que a outro.
Este é o manifesto supremo do amor cristão. Não somos servos de Deus, pois Ele não se impõe de cima para que lhe obedeçamos, mas nos chama e nos faz “amigos” seus. Também não somos empregados de Deus, para triunfo e glória de sua empresa, pois não temos na vida outra tarefa nem outra finalidade que ser seus amigos, mas somos amigos de Deus somente em Jesus, pois “ninguém tem amor maior do que aquele que dá sua vida pelos amigos” (Jo 15, 13).
Dom Félix
Fonte: Artigo “A Amizade com Jesus na Palavra e na Eucaristia” (32ª Parte).