A Igreja no Brasil está em festa! Por ocasião do Jubileu dos 300 anos do encontro da Imagem de Nossa Senhora da Conceição Aparecida nas águas do Rio Paraíba do Sul e dos 100 anos da Aparição de Nossa Senhora em Fátima, Portugal, a CNBB instituiu o Ano Nacional Mariano, que começou em 12 de outubro de 2016, Solenidade da Padroeira do Brasil, e terminará em 11 de outubro de 2017. Portanto, é um tempo favorável para contemplar Maria de Nazaré, a Mãe de Jesus, na vida da Igreja e da Família como modelo de fé e de seguimento do Cristo.
O Concílio Vaticano II projetou uma nova luz sobre o papel da Mãe de Jesus na vida da Igreja e da família. Apresentando Maria no mistério de Cristo, encontra desse modo o caminho para aprofundar também o conhecimento do mistério da Igreja e da família, pois a Família é a Igreja Doméstica e a Igreja é a Família dos filhos e filhas de Deus.
Maria, pelo dom da maternidade divina, que a une ao seu Filho Redentor, encontra-se também intimamente unida à Igreja e à família: Ela é figura da Igreja, na ordem da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo. A família, por sua vez, é a Igreja em miniatura, a Igreja doméstica. Logo, Maria é também figura da família.
Maria acreditou que se cumpririam aquelas coisas que lhe tinham sido ditas da parte do Senhor. Como Virgem, acreditou que conceberia e daria à luz um filho. Como serva do Senhor, permaneceu perfeitamente fiel à pessoa e à missão do seu Filho. Como Mãe, pela sua fé e obediência, gerou na Terra o próprio Filho de Deus, sem a cooperação de um homem, mas por obra e graça do Espírito Santo.
Como Virgem, Mãe e Serva, Maria permanece um “modelo perene” para a Igreja e a família. Também a Igreja e a família são chamadas a ser Mãe, Virgem e Serva. Elas se tornam Mãe pela fiel recepção da Palavra de Deus. Assim como Maria acolheu a Palavra no coração e a gerou em sua vida e em seu ventre, assim também a Igreja e a família, acolhendo com fidelidade a Palavra de Deus, pela pregação e o batismo, geram para uma vida nova e imortal os filhos, concebidos por obra do Espírito Santo e nascidos de Deus. A Igreja e a família são geradoras da vida divina; pois, vivificadas pelo Espírito Santo, “geram” filhos e filhas da família humana para uma vida nova em Cristo.
Ao mesmo tempo, a exemplo de Maria, a Igreja permanece a Virgem fiel ao próprio Esposo, que guarda íntegra e pura a fé. No matrimônio, marido e mulher se unem entre si, em Cristo, e se consagram um ao outro, assim como Cristo se consagrou à Igreja e a Igreja é chamada a se consagrar a Cristo. A Igreja guarda a fé recebida de Cristo: a exemplo de Maria, que guardava e meditava no seu coração tudo o que dizia respeito ao seu divino Filho, a Igreja está empenhada em guardar a Palavra de Deus, apurando as suas riquezas com discernimento e prudência, para dar da mesma, ao longo dos tempos, testemunho fiel a todas as pessoas. Também a família guarda a fé recebida de Cristo: a exemplo de Maria, os pais são os primeiros educadores da fé dos filhos, seus primeiros catequistas, mediante o ensino da doutrina cristã e o testemunho de vida familiar.
A Igreja descobre-se na Virgem Maria e procura tornar-se semelhante a ela. Maria está presente, portanto, no mistério da Igreja como modelo perene. O mistério da Igreja consiste também em gerar os homens para uma vida nova e imortal: é a sua maternidade no Espírito Santo. Da mesma forma, a exemplo de Maria, a família é chamada a gerar filhos não só para a vida biológica, mas também para a vida espiritual. Nessa maternidade espiritual, Maria coopera com amor de mãe para a regeneração e formação dos filhos e filhas da Mãe Igreja e da família.
Trata-se de uma maternidade na ordem da graça, porque invoca o dom do Espírito Santo que suscita os novos filhos de Deus, remidos pelo sacrifício de Cristo.
É algo essencial à maternidade o fato de ela envolver a pessoa. Ela determina sempre uma relação única e irrepetível entre duas pessoas: da mãe com o filho e do filho com a mãe, mesmo quando uma só “mulher” é mãe de muitos filhos.
Pode-se dizer que “a maternidade na ordem da graça” tem analogia com a que “na ordem da natureza” caracteriza a união da mãe com o filho. Por isso, na Cruz, o Redentor confia sua Mãe ao discípulo amado, que representa todo cristão, e, ao mesmo tempo, dá-lha como Mãe. Aos pés da Cruz, teve início aquela especial entrega do ser humano à Mãe de Cristo. A entrega é a resposta ao amor duma pessoa e, em particular, ao amor da mãe.
A dimensão mariana da vida de um discípulo de Cristo exprime-se, de modo especial, precisamente mediante essa entrega filial em relação à Mãe de Cristo. Confiando-se filialmente a Maria, o cristão, como o Apóstolo João, a acolhe na sua casa, na casa do seu coração, do seu “eu” humano e cristão. O acolhimento de Maria por parte do discípulo vai além da simples hospedagem em sua casa; designa uma comunhão de vida (em família) que se estabelece entre os dois, em virtude das palavras de Cristo ao morrer.
Essa relação filial, esse entregar-se de um filho à Mãe, não só tem o seu início em Cristo, mas está definitivamente orientado para Ele. Maria continua a repetir a todos as mesmas palavras que disse em Caná da Galileia: “Fazei tudo o que Ele vos disser” (Jo 2, 5).
Ao narrar a presença de Maria na vida pública de Jesus, o Evangelista João nos recorda a sua participação em Caná, por ocasião do primeiro sinal. Salienta o papel discreto e, ao mesmo tempo, eficaz da Mãe que, com a sua palavra, leva o filho ao “primeiro sinal”. Ela, embora exerça uma influência discreta e materna, com a sua presença resulta, no final, algo determinante. A iniciativa da Virgem aparece ainda mais surpreendente se considerarmos a condição de inferioridade da mulher na sociedade judaica.
Em Caná, com efeito, Jesus não só reconhece a dignidade e o papel do gênero feminino mas, acolhendo a intervenção de Sua Mãe, oferece-lhe a possibilidade de ser partícipe na obra da salvação. Não contraria com esta intenção de Jesus o apelativo “Mulher”, com o qual Ele se dirige a Maria. Ele, de fato, não contém em si nenhuma conotação negativa e será de novo usado por Jesus em relação à Mãe, aos pés da Cruz (Jo 19, 26). Segundo alguns intérpretes, este título “mulher” apresenta Maria como a nova Eva, Mãe de todos os crentes na fé.
O evangelista usa a expressão “movida de compaixão”, deixando entender que Maria era inspirada pelo seu coração misericordioso. Tendo notado a eventualidade da tristeza dos esposos e dos convidados pela falta de vinho, Maria, compadecida, sugere a Jesus que intervenha com seu poder salvador. A alguns o pedido de Maria parece desproporcionado, porque subordina a um ato de piedade o início dos sinais do Messias. A esta dificuldade respondeu Jesus mesmo que, com o seu assentimento à solicitação materna, demonstra a superabundância com que Deus responde as expectativas humanas, manifestando também quanto pode o amor de uma Mãe.
A expressão “dar início aos sinais” chama nossa atenção. O termo início, princípio, foi usado por João no prólogo do seu Evangelho: “No princípio existia o Verbo”. Esta coincidência induz a estabelecer um paralelo entre a primeira origem da glória de Cristo na eternidade e a primeira manifestação da mesma glória na sua missão terrena. Ressaltando a iniciativa de Maria no primeiro sinal e recordando depois a sua presença no Calvário, aos pés da Cruz, o evangelista João nos ajuda a compreender como a cooperação de Maria se estende à inteira obra de Cristo.
O pedido de Maria coloca-se no interior do desígnio divino de salvação. No primeiro sinal realizado por Jesus, os Padres da Igreja perceberam uma forte dimensão simbólica, acolhendo, na transformação da água em vinho, o anúncio da passagem da antiga à nova Aliança. Em Caná, precisamente a água das jarras, destinada à purificação dos Judeus e ao cumprimento das prescrições legais (Mc 7, 1-15), torna-se o vinho novo do banquete nupcial, símbolo da união definitiva entre Deus e a humanidade.
O contexto de um banquete de núpcias, escolhido por Jesus para o Seu primeiro sinal, remete ao simbolismo matrimonial, frequente no Antigo Testamento, para indicar a Aliança entre Deus e o Seu povo e no Novo Testamento para significar a união de Cristo com a Igreja.
A presença de Jesus em Caná manifesta, além disso, o projeto salvífico de Deus a respeito do Matrimônio. Nessa perspectiva, a falta de vinho pode ser interpretada como alusiva à falta de amor, que infelizmente, não raro, ameaça a união conjugal. Maria pede a Jesus que intervenha em favor de todos os esposos, pois só um amor fundado em Deus pode libertar dos perigos da infidelidade, da incompreensão e das divisões. A graça do Sacramento do Matrimônio oferece ao casal esta força superior de amor, que pode fortalecer o empenho da fidelidade conjugal também nas circunstâncias difíceis.
Segundo a interpretação de autores cristãos, o sinal de Caná contém, além disso, um profundo significado eucarístico. Realizando-o na proximidade da Festa da Páscoa judaica, Jesus manifesta, como na multiplicação dos pães, a intenção de preparar o verdadeiro banquete pascal, a Eucaristia. Esse desejo, nas bodas de Caná, parece sublinhado ainda mais pela presença do vinho, que alude ao sangue da Nova aliança, e pelo contexto de um banquete. Desse modo, Maria, depois de ter estado na origem da presença de Jesus na festa de Caná, obtém o milagre do vinho novo, que prefigura a Eucaristia, sinal supremo da presença do seu Filho ressuscitado entre os discípulos.
No final da narração do primeiro sinal de Jesus, que se tornou possível pela fé sólida da Maria no seu divino Filho, o evangelista conclui: “Seus discípulos acreditaram n’Ele”. Em Caná Maria inicia o caminho da fé da Igreja, precedendo os discípulos e orientando para Cristo a atenção dos servos. Sua perseverante intercessão também encoraja aqueles que às vezes se encontram diante da experiência do “silêncio de Deus”. Eles são convidados a esperar para além de toda a esperança, confiando sempre na bondade do Senhor.
Essa dimensão mariana da vida cristã na Igreja e na família assume um relevo particular no que respeita à mulher e à condição feminina. Com efeito, a figura de Mara de Nazaré projeta luz sobre a mulher enquanto tal, pelo fato exatamente de Deus, no sublime acontecimento da Encarnação do Filho, se ter confiado aos bons préstimos, livres e ativos, da mulher. Pode-se, portanto, afirmar que a mulher, olhando para Maria, nela encontrará o segredo para viver dignamente sua feminilidade e levar a efeito a sua verdadeira promoção. À luz de Maria, a Igreja lê no rosto da mulher os reflexos de uma beleza, que é espelho dos mais elevados sentimentos que o coração humano pode acolher: a totalidade do dom de si no amor; a força que é capaz de resistir aos grandes sofrimentos; a fidelidade sem limites, a operosidade incansável e a capacidade de conjugar a intuição penetrante com a palavra de apoio e encorajamento.
Nesta oportunidade, quero agradecer aos agentes da pastoral familiar pelo valioso serviço que realizam em favor da família, do jeito que ela se encontra na atualidade, com suas virtudes e defeitos, com seus êxitos e fracassos, com suas aspirações e frustrações, e desejar-lhes fidelidade, perseverança e êxito na evangelização da família.