Nas celebrações da Semana Santa, muitas vezes corremos o risco de nos deter no secundário e esquecer o essencial. E o mais essencial é que suas celebrações nos aproximem e nos façam crescer na identificação com o protagonista principal: Jesus de Nazaré. Por isso, precisamos voltar constantemente ao Evangelho – e recuperar o seu frescor original – para compreender o que é essencial sobre Jesus.
Jesus não foi conivente nem compactuou com a estrutura social, política e religiosa de seu tempo, que era profundamente desumanizadora. Ele sonhou novas possibilidades de vida e novas relações entre as pessoas. Por isso, ao anunciar o Reino, transgrediu abertamente a situação vigente e, a partir da periferia (a Galileia dos pagãos), foi despertando uma alentadora esperança no coração dos mais pobres e excluídos, vítimas de um mundo fechado.
A entrada de Jesus em Jerusalém revela que Jesus foi transgressor e rebelde frente ao poder estabelecido, sobretudo o poder religioso, que impunha suas normas de verdade e de pureza acima da vida. Jesus sabia que com isso arriscava sua vida. Mas, ao pressentir seu final violento, não arredou pé; pelo contrário, enfrentou as autoridades do Templo e do Palácio.
Para Jesus o que estava em jogo não era a sua vida, mas a Vida: era a antiga promessa dos profetas, era a libertação universal esperada, era a igualdade entre homens e mulheres, era a erradicação de toda violência, era a instauração do Reino do amor, da justiça e da paz.
Tudo isso estava em jogo. E a fé de Jesus, ao mesmo tempo, mansa e rebelde, foi maior que seu medo. Montou sobre um humilde jumentinho e desafiou o Império e o Templo, com suas cortes e legiões e com todas as suas desumanas ordens sagradas.
Jesus entra em Jerusalém rodeado do povo simples, das pessoas humildes. Esse povo escravo e oprimido o aclama porque vê nele uma luz de esperança, de vida, de libertação. Escutaram suas palavras e viram seus feitos durante alguns anos. Escutaram palavras de vida, de justiça, de amor, de misericórdia, de paz… Viram seus gestos de cura dos enfermos, de defesa dos fracos, de dar alimento aos famintos, de reabilitar os desprezados, de acolher os marginalizados, de enfrentamento dos opressores… E percebem que Jesus quer continuar anunciando e realizando em Jerusalém aquilo que fizera na região excluída da Galileia; quer também humanizar esta cidade para que ela seja sol de justiça e de paz para todos os povos.
E nós? Se quisermos continuar a percorrer o caminho que Jesus percorreu, temos de crer firmemente que é possível construir um mundo diferente do mundo em que vivemos. Um mundo no qual a fraternidade supere a violência. Um mundo onde a igualdade e a verdadeira democracia se façam realidade. Um mundo no qual se respeitem os direitos das pessoas, onde o compartilhar seja o mais normal e natural. Um mundo no qual se dê um basta definitivo na corrupção, na impunidade, na ganância, na injustiça contra os indefesos…
A espiritualidade cristã nos convida a descobrir e a indicar a presença real de Deus nas pessoas e nos acontecimentos bons e maus do dia a dia, presença essa que nos interpela a partir do reverso da história, a partir dos lugares insignificantes de nossa sociedade.
Para nós cristãos, “entrar em Jerusalém” é comprometer-nos com um mundo mais humano e humanizado, o mundo que sonhamos e que queremos para todos: o novo céu e nova terra. E o seguidor de Jesus tem em quem se inspirar. Amém.