Na Ascensão, Jesus não nos abandona, pois realizou uma comunhão definitiva com a humanidade, garantindo-lhe um destino de plenitude. Ele subiu ao céu para abrir-nos o caminho, mas agora é o Espírito quem nos move e nos conduz ao Pai. Cabe a nós esforçar-nos em fazer o nosso êxodo, sob a ação do mesmo Espírito e confiantes na fidelidade de Deus.
Com a Ascensão, Jesus conclui a sua missão terrena, que foi transmitida a nós, seus discípulos. Agora é tempo de nos mover, de sair, de pôr-nos a caminho. É preciso por em prática tudo o que foi escutado e experimentado. É tempo de “expulsar demônios”, de “curar enfermos” e de “falar linguagens novas”. Cada um de nós pode dar nome aos “demônios”, às “enfermidades” e às “linguagens novas”.
É preciso dar nome aos “demônios” (às tentações) que somos chamados a expulsar da nossa vida, da nossa família, da nossa comunidade, da sociedade: egoísmo, individualismo, comodismo, medo, ganância, consumismo, indiferença, preconceito, intolerância, mentira, injustiça, corrupção, libertinagem, vícios…
É preciso dar nome às “enfermidades” que devemos curar: doenças do corpo e da alma, perda do sentido da vida, perda da fé em Deus e na humanidade (pensa que o mundo está perdido e que ninguém presta!), perda dos valores morais, estresse, depressão, transtornos psíquicos, laxismo, puritanismo…
É preciso dar nome à “linguagem” que devemos praticar com insistência: mais do que falar outro idioma, devemos falar a linguagem do amor, da misericórdia, do perdão, da compreensão, da compaixão, da correção fraterna. Agora, através do seu Espírito, o Senhor Jesus nos coloca em movimento com um envio apaixonante: o de anunciar ao mundo inteiro, pela palavra e pelo testemunho, a Boa Notícia de que Deus é nosso Pai e nós todos somos irmãos e irmãs em Cristo.
Ao mistério da Ascensão corresponde o mistério do esvaziamento do Verbo de Deus, que se despojou de sua glória e majestade e se fez homem, e agora é elevado aos céus junto com nossa humanidade redimida. Em Cristo, a humanidade inteira já se encontra envolvida por Deus; em Cristo, céus e terra se encontram.
A Ascensão nos revela que a terra termina no céu, o tempo na eternidade, o ser humano em Deus. Mas o céu, a esperança, o horizonte, estão já presentes em nosso hoje, dando sentido. O futuro sonhado e esperado é a alegria do presente. O céu não pode esperar!
Os primeiros cristãos contemplavam a ressurreição de Jesus como o início da reconciliação entre o céu e a terra. Jesus “sobe ao céu” para que se realize sua “conexão” definitiva com a terra; Jesus sobe ao céu para que o céu desça à terra. Essa é a oração que Jesus ensinou àqueles que o seguiam: “Venha a nós o vosso Reino; seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu”.
O que dizemos da terra e o que a ciência da ecologia nos mostra cada vez com mais evidência é que, no mundo, tudo está interconectado, todas as manifestações de vida estão inter-relacionadas. Assim, com muito mais razão, é preciso dizer de uma maneira muito especial sobre a Ascensão: Jesus sobe para “conectar” tudo. Esta é a ecologia do Espírito do Ressuscitado: o céu na terra e a terra no céu. Esta é a ecologia integral: a ressurreição transformou absolutamente tudo, uniu tudo. Uma estupenda beleza nasceu e nós estamos integrados neste cenário.
Na Bíblia, céu e terra querem exprimir, espacialmente, a totalidade da Criação de Deus; por isso, Deus é Senhor do céu e da terra. Tudo, então, chegará à plena reconciliação: o céu terá descido à terra e a terra será elevada ao céu. E, então, será a plenitude: “Deus será tudo em todas as coisas” (1Cor 15, 28).
A tradição nos recorda que o Espírito Santo é o mesmo na terra e no céu, que o Amor é o mesmo na terra e no céu. Todos os atributos divinos que podemos viver no espaço-tempo são nossa realidade celeste.
O movimento desencadeado por Aquele que Vive é um movimento que reúne para ativar a vida, para restaurar vínculos rompidos, para libertar das ataduras que escravizam. Jesus “subiu” ao céu porque “desceu” às profundezas da terra. E assim também nos mostrou o caminho. Não podemos subir ao céu se não estivermos dispostos a descer com Cristo à condição terrena, à nossa fraqueza humana.
Nós “subimos” a Deus quando “descemos” à nossa humanidade. Este é o caminho da liberdade, do amor e da humildade, da mansidão e da misericórdia; é o caminho de Jesus também para nós. A vida cristã não é “subida” para fora da realidade, mas “descida” para o mais profundo da mesma. Entramos no movimento da Ascensão quando amamos, servimos, cuidamos; nós nos elevamos quando investimos nossa vida num projeto em favor da vida.
Dom Antônio Carlos Félix
Fonte: Artigo do Pe. Adroaldo Palaoro, SJ.