Artigos de Dom Antônio Carlos Félix Sobre o Catecismo da Igreja Católica
1. Visão geral do Catecismo da Igreja Católica
No dia 11 de outubro de 1992, o saudoso Papa João Paulo II, hoje São João Paulo, entregou aos fiéis de todo o mundo o Catecismo da Igreja Católica, apresentando-o como “texto de referência” para uma catequese renovada nas fontes da fé. Trinta anos depois do Concílio Vaticano II (1962-1965), era assim levado a uma feliz realização o desejo expresso, em 1985, pela Assembléia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, para que fosse composto um catecismo de toda a doutrina católica, quer para a fé, quer para a moral.
O Catecismo da Igreja Católica se articula em quatro partes, em correspondência com as leis fundamentais da vida em Cristo.
A primeira parte, intitulada “A profissão da fé”, contém uma oportuna síntese da lex credendi, isto é, da fé professada pela Igreja Católica, retirada do Símbolo Apostólico ilustrado com o Símbolo Niceno-Constantinopolitano, cuja constante proclamação nas assembléias cristãs mantém viva a memória das principais verdades da fé.
A segunda parte, intitulada “A celebração do mistério cristão”, apresenta os elementos essenciais da lex celebrandi. O anúncio do Evangelho encontra, de fato, a sua resposta privilegiada na vida sacramental. Nela, os fiéis experimentam e testemunham em cada momento de sua existência a eficácia salvífica do mistério pascal, por meio do qual Cristo realizou a obra da nossa redenção.
A terceira parte, intitulada “A vida em Cristo”, evoca a lex vivendi, isto é, o esforço que os batizados fazem para manifestar nos seus comportamentos e nas suas escolhas éticas a fidelidade à fé professada e celebrada. Os fiéis, de fato, são chamados pelo Senhor Jesus a realizar as obras próprias de sua dignidade de filhos do Pai na caridade do Espírito Santo.
A quarta parte, intitulada “A oração cristã”, oferece uma síntese da lex orandi, isto é, da vida de oração. A exemplo de Jesus, o modelo perfeito de orante, também o cristão é chamado ao diálogo com Deus na oração, cuja expressão privilegiada é o Pai Nosso, a oração ensinada pelo próprio Jesus.
2. A revelação divina e sua transmissão
Por amor, Deus revelou-Se e deu-Se ao homem. Dá assim uma resposta definitiva e superabundante às questões que o homem se põe a si próprio sobre o sentido e o fim da sua vida. Deus revelou-Se ao homem, comunicando-lhe gradualmente o seu próprio mistério, por ações e por palavras.
Além do testemunho que dá de Si mesmo através das coisas criadas, Deus manifestou-Se a Si próprio aos nossos primeiros pais. Falou-lhes e, depois da queda, prometeu-lhes a salvação e ofereceu-lhes a sua aliança. Deus concluiu com Noé uma aliança eterna entre Si e todos os seres vivos. Essa aliança durará enquanto durar o mundo. Deus escolheu Abraão e concluiu uma aliança com ele e os seus descendentes. Fez deles o seu povo, ao qual revelou a sua Lei por meio de Moisés. E preparou-o, pelos profetas, a acolher a salvação destinada a toda a humanidade. Deus revelou-Se plenamente enviando o seu próprio Filho, no qual estabeleceu sua aliança para sempre. O Filho é a Palavra definitiva do Pai, de modo que, depois d’Ele, não haverá outra Revelação.
O que Cristo confiou aos Apóstolos, estes o transmitiram, pela sua pregação e por escrito, sob a inspiração do Espírito Santo, a todas as gerações, até à vinda gloriosa de Cristo.
A Sagrada Tradição e a Sagrada Escritura constituem um único depósito sagrado da Palavra de Deus, no qual, como num espelho, a Igreja peregrina contempla Deus, fonte de todas as suas riquezas. Na sua doutrina, vida e culto, a Igreja perpetua e transmite a todas as gerações tudo aquilo que ela é, tudo aquilo em que acredita.
Graças ao sentido sobrenatural da fé, o povo de Deus não cessa de acolher o dom da Revelação divina, de nele penetrar mais profundamente e viver dele mais plenamente. O encargo de interpretar autenticamente a Palavra de Deus foi confiado unicamente ao Magistério da Igreja, ao Papa e aos bispos em comunhão com ele.
Toda Escritura divina é um só livro, e esse livro único é Cristo, porque toda ela fala de Cristo e toda ela se cumpre em Cristo. Ela contém a Palavra de Deus; e, pelo fato de ser inspirada, é verdadeiramente a Palavra de Deus. Deus é seu autor, ao inspirar os seus autores humanos: age neles e por eles. E assim nos dá a garantia de que os seus escritos ensinam, sem erro, a verdade da salvação.
A interpretação da Escritura inspirada deve, antes de mais nada, estar atenta ao que Deus quer revelar, por meio dos autores sagrados, para nossa salvação. O que vem do Espírito não é plenamente entendido senão pela ação do Espírito.
A Igreja recebe e venera, como inspirados, os 46 livros do Antigo e os 27 do Novo Testamento. Os evangelhos ocupam um lugar central, dado que Jesus Cristo é o seu centro. A unidade dos dois Testamentos deriva da unidade do plano de Deus e da sua Revelação. O Antigo Testamento prepara o Novo, ao passo que o Novo dá cumprimento ao Antigo. Os dois esclarecem-se mutuamente; ambos são verdadeira Palavra de Deus. A Igreja sempre venerou as Divinas Escrituras, tal como o próprio Corpo do Senhor; ambos alimentam e regem toda a vida cristã.
3. A resposta do homem a Deus
O homem é, por natureza e vocação, um ser religioso. Vindo de Deus e caminhando para Deus, o homem não vive uma vida plenamente humana senão na medida em que livremente viver a sua relação com Deus. O homem foi feito para viver em comunhão com Deus, em quem encontra a sua felicidade. Quando escuta a mensagem das criaturas e a voz da sua consciência, o homem pode alcançar a certeza da existência de Deus, causa e fim de tudo.
A Igreja ensina que o Deus único e verdadeiro, nosso Criador e Senhor; pode ser conhecido com certeza pelas suas obras, graças à luz natural da razão humana. Nós podemos realmente falar de Deus partindo das múltiplas perfeições das criaturas, semelhanças de Deus infinitamente perfeito, ainda que a nossa linguagem limitada não consiga esgotar o mistério. A criatura sem o Criador esvai-se. Por isso, os crentes sentem-se pressionados pelo amor de Cristo a levar a luz do Deus vivo aos que O ignoram ou rejeitam.
A fé é uma adesão pessoal, do homem todo, a Deus que Se revela. Comporta uma adesão da inteligência e da vontade à Revelação que Deus fez de Si mesmo, pelas suas ações e palavras.
«Crer» tem, pois, uma dupla referência: à pessoa e à verdade; à verdade, pela confiança na pessoa que a atesta. Não devermos crer em mais ninguém senão em Deus, Pai, Filho e Espírito Santo. A fé é um dom sobrenatural de Deus. Para crer, o homem tem necessidade dos auxílios interiores do Espírito Santo. «Crer» é um ato humano, consciente e livre, que está de acordo com a dignidade da pessoa humana. «Crer» é um ato eclesial. A fé da Igreja precede, gera, suporta e nutre a nossa fé.
A Igreja é a Mãe de todos os crentes. Ninguém pode ter a Deus por Pai, se não tiver a Igreja por Mãe. Nós cremos em tudo quanto está contido na Palavra de Deus, escrita ou transmitida, e que a Igreja propõe à nossa fé como divinamente revelado. A fé é necessária para a salvação. O próprio Senhor o afirma: «Quem crer e for batizado será salvo, quem não crer será condenado» (Mc 16, 16). A fé é um antegozo do conhecimento que nos tornará felizes na vida futura.