Embora a reflexão sobre o método pastoral (metá = fim + odos = caminho) seja vista por muitos como insignificante, periférica ou desvinculada da pulsação vital do existir, arrastando pouca empatia em seu exercício, como se consistisse simplesmente num conjunto de regras formais, frias e distanciadas do que realmente fazem as pessoas, ela é fundamental porque diz respeito à nossa ação eclesial, ao modo como realizamos a ação evangelizadora. Além de ser um dobrar-se sobre a ação que se contrapõe a improviso, o método pastoral é fruto do saber acumulado das experiências eclesiais, em vista dos objetivos pretendidos. Considerando tal aspecto, o método é simultaneamente possibilidade e limite, porque permite um viés, enfoque ou olhar e não outros. À prescruta dos melhores caminhos para realizar sua ação pastoral, a Igreja passou a utilizar a partir do Concílio Vaticano II o método “Ver-Julgar-Agir”. Na esteira de influência do Concílio, as conferências do episcopado latino-americano desde Medellín, em 1968, as Campanhas da Fraternidade no Brasil, desde 1964, os documentos produzidos pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e até mesmo alguns documentos pontifícios, têm todos se servido das contribuições do método pastoral “Ver-Julgar-Agir”.
Conforme a perspectiva teológica, o método pastoral “Ver-Julgar-Agir” exprime a guinada na reflexão sobre método teológico: a passagem do método dedutivo ao indutivo. Em linhas gerais, o método dedutivo consiste em partir das afirmações dogmáticas, fundamentá-las na Escritura e, em seguida, aplicar a reflexão obtida na compreensão da realidade. O perigo corrido nesse empreendimento metodológico está em produzir uma teologia altamente especulativa, mas desvinculada da ação pastoral e da vida. O método indutivo, inaugurado pelo Concílio Vaticano II, faz o caminho inverso do dedutivo. Como anseio de uma teologia com maior incidência sobre o mundo, propõe partir da realidade, com seus desafios, para buscar luzes na Escritura e na Tradição da Igreja. A Constituição Pastoral Gaudium et Spes (Alegrias e Esperanças), do Concílio Vaticano II, fundamentou tal mudança, ao tomar como ponto de partida a condição em que se encontra o homem atual, sobretudo os mais pobres, e ao afirmar que tal situação é a dos discípulos de Cristo: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo” (GS, nº 1).
O método pastoral “Ver-Julgar-Agir” propiciou enorme avanço na ação pastoral da Igreja, rompendo com o distanciamento entre a Igreja e o Mundo. Ao partir da situação do homem atual, propunha a própria realidade como objeto da reflexão teológica e da ação pastoral. Metodologicamente, isso se deu através da articulação dos seus três momentos fundamentais: primeiro momento: Ver (consiste em olhar, observar e analisar atentamente a realidade com o auxílio das ciências humanas e sociais para dar-se conta das suas contradições: sombras e luzes, pecado e graça); segundo momento: Julgar (trata-se de interpretar ou compreender a realidade com a iluminação da Escritura e da Tradição de Igreja); e terceiro momento: Agir (apresenta pistas e diretrizes para transformar a realidade conforme a perspectiva do Reino de Deus). Recentemente, o Papa Francisco enriqueceu o método “Ver-Julgar-Agir” com suas inspirações pastorais. No lugar de “Ver-Julgar-Agir” tem preferido expressões como “escutar”, “contemplar” e “acompanhar” ou “contemplar”, “discernir” e “agir”. Tal preferência não significa simplesmente mera mudança de nomenclatura, mas aguçada sensibilidade pastoral. “Contemplar”, por exemplo, permite maior alcance ao “Ver”, já que indica mais do que somente uma visão analítica da realidade, e sim o olhar esperançado de discípulo, que contempla a realidade a ser transformada. Do mesmo modo, “discernir” é uma ação do Espírito Santo em nós decorrente da Palavra de Deus, que nos capacita a decidir e a agir conforme a vontade divina.
Por fim, outra sugestão oferecida pelo Papa Francisco ao rejuvenescimento do método “Ver-Julgar-Agir” e, pode-se afirmar, que se constitui também em marca do seu ministério é “escutar”. Não apenas seu pontificado tem sido assinalado pela escuta, mas seu anseio é de que esta seja, por excelência, virtude da Igreja em sua disposição de ouvir, o que significa sinônimo de sinodalidade. Para conhecer o outro, em suas necessidades e verdades, é preciso ouvi-lo. A escuta oferece sensibilidade ao método pastoral “Ver-Julgar-Agir”. Parafraseando Clifford Geertz, um dos maiores expoentes da tradição antropológica norte-americana do século XX, ao diferenciar o método investigativo da antropologia do que se usa nas demais ciências sociais, como a sociologia, afirmou ser o método da disciplina antropológica mais artesanal, qualitativo, e, portanto, mais dependente das qualidades do observador do que dos critérios e regras formais que o compõe. O diferencial do trabalho antropológico consiste em “conversar com o homem do arrozal ou a mulher do bazar, quase sempre em termos não convencionais, no estilo ‘uma coisa leva a outra e tudo leva a tudo mais’, em língua vernácula e por longos períodos de tempo, sempre observando muito de perto como eles se comportam”. Assim como na antropologia, a sensibilidade para a escuta marca profundamente o método teológico-pastoral da Igreja. O diferencial, nesse caso, está em escutar o Povo de Deus, ouvir seus anseios, esperanças, dúvidas e sugestões.